Esta peça é baseada no romance de Christa Wolf, no qual ela relata a estória do declínio de Tróia a partir da perspectiva feminina de Kassandra. É uma peça sobre a guerra, mas também sobre as liberdades civis, sobre o direito à clareza contra os sistemas de poder, organizados em estruturas hierárquicas, e sobre as crueldades sofridas pelos excluídos e o próprio processo de exclusão, com as suas leis invisíveis. Por que alguém começa uma guerra? Ao apresentar à audiência máquinas mortíferas, Kassandra incita os espectadores a questionar os valores da guerra e do heroísmo que permeiam a nossa cultura. O que aconteceu com esses valores frente aos horrores do século XX? O que aconteceu com as nossas tradições artísticas e a sua capacidade de examinar a nossa civilização? No contexto atual, seria a vanguarda — um conceito artístico que descuidadamente toma emprestada uma metáfora da guerra — nada mais que um irresponsável salto para adiante? Utilizando elementos e materiais iconográficos da Segunda Guerra Mundial, da Alemanha Nazista e do bombardeio atômico de 1945, a performance recupera o significado de uma arte que não se acovarda diante das questões cruciais e dolorosas do nosso tempo, mas, ao contrário, as enfrenta e confronta, a fim de compreendê-las melhor. Concebida como um sincretismo heterogêneo de temporalidades, Kassandra baseia-se no antigo arquivo trágico das mulheres vitimizadas de Tróia, comprimindo aproximadamente três mil anos de cultura em gestos simultâneos e similares: estupro, pilhagem e o imperialismo belicoso masculino, representado por uma falocracia que permeia o comportamento e o discurso masculino ocidental.

quarta-feira, 15 setembro 2010 19:15

A saga de Canudos (2000)

Por meio de máscaras e marionetes, música e dança, A saga de Canudos conta a estória da construção e da destruição da cidade de Canudos em uma das guerras civis mais mortíferas que o Brasil já viu. A performance recupera os aspectos políticos do movimento liderado por Antônio Conselheiro no século XIX. Assolados pela fome e pela opressão, milhares de sertanejos reuniram-se em torno dessa figura legendária. A terra, os rebanhos, as ferramentas, tudo era propriedade coletiva, as tarefas eram distribuídas de acordo com a capacidade de cada um e as decisões eram tomadas coletivamente, em encontros diários. O seu lema, porém — “A terra não tem dono. A terra pertence a todos” — foi considerado um desafio direto aos proprietários de terra, ao governo e à igreja. A historiografia oficial pintou Antônio Conselheiro como um fanático, mas esta peça o apresenta como um homem consciente do seu papel histórico, um homem que lutou contra a escravidão e contra o monopólio da terra, que desafiou a igreja e o governo e que liderou os camponeses a derrotar o Exército Nacional diversas vezes.

quinta-feira, 05 agosto 2010 15:53

Sessão de Anistia a Zé Celso (2010)

Em 1974, José Celso Martinez Corrêa foi preso pela ditadura militar e levado para o DOPS – o Departamento de Ordem Política e Social –, onde ele foi brutalmente torturado e posto na cadeia. Trinta anos depois, o diretor teatral deu entrada em um pedido de perdão oficial e de compensação perante a Comissão de Anistia. Esta comissão tinha sido criada pela Lei no 10.559 de 2002, que complementou a infame Lei no 6.683 de 1979, que concedeu anistia geral para todos que haviam cometido crimes políticos sob o regime ditatorial, tanto como parte do exército quanto da resistência.

Em 2010, a Comissão de Anistia realizou a sua 35a sessão pública no Teatro Oficina, para realizar a leitura e a votação do pedido de Zé Celso. À teatricalidade oficial da lei, combinou-se O Banquete, uma peça do grupo, e a audiência foi recebida com uma canção servo-croata, seguida da lavação dos seus pés por um dos membros do elenco, caracterizado. O relator para o caso foi o advogado e ator Prudente José Silveira Mello, que fez a leitura do relatório vestindo um terno e de pés descalços, no cenário da peça.


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terça-feira, 13 julho 2010 17:11

Encarnado (2005)

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In 2003, Lia Rodrigues Companhia de Danças was invited by CEASM, the Centre for Study and Social Action at the Favela da Maré, for a residency at the Maré Culture House. Favela da Maré is one of the largest complexes of favelas in Rio de Janeiro, with a population of over 130,000. The initial material for this production was a series of questions: Is it possible to identify with those who suffer? How are we affected by our own pains? What are the things that really count in our lives? How can we break borders and recreate a common territory? How can dance interfere, or even exist, in the context of a reality as tragic as Brazil's? encarnado was created in the space of the favela keeping an open door policy, so that members of the community could watch rehearsals, and the dancers could interact with the community. The assumption was that the body, in contact with a new space, produces a new way of moving, of thinking, of generating new forms of organization.

De 2000 a 2007, o Teat(r)o Oficina Uzyna Uzona trabalhou na encenação de ‘Os Sertões’, o livro épico de Euclides da Cunha que descreve a Guerra de Canudos do século XIX no sertão brasileiro, liderado por Antônio Conselheiro. O resultado final foi uma pentalogia, formada pelas peças ‘A Terra’ (2002), ‘O Homem I’ (2003), ‘O Homem II’ (2003), ‘A Luta I’ (2005) e ‘A Luta II’ (2006), totalizando 27 horas de teatro. ‘Os Sertões’ relata os episódios da Guerra à luz da história passada e presente do Brasil e em relação à batalha do grupo contra o magnata da mídia Sílvio Santos, que queria derrubar o teatro histórico.

Dedicada a "todo o poder do Des-massacre da Arte e aos efeitos do poder Trans-Humano da Multidão", a teatralização da última parte do livro fala da quarta e última expedição pelo Exército Nacional Brasileiro ao sertão nordestino, com a mobilização de 12 mil soldados, canhões e armas modernas, além de modernos estrategistas como o Marechal Bittencourt, que, pela primeira vez na história do Exército Brasileiro, estabeleceu uma base operacional distante da frente de combate, de onde ele comandou as manobras chefiadas pelo General Artur Oscar e secundadas pelo sanguinário General Barbosa, que foi executado. A peça mostra o fim da Guerra de Canudos, que resultou no massacre dos sertanejos, na morte do próprio Antônio Conselheiro (que foi encontrar-se com Deus) e na destruição da cidadela. No Teatro Oficina, o massacre é encenado não como uma missa de repetição do martírio, mas a partir da perspectiva de um des-massacre. Ao expor esse abcesso fechado da História do Brasil na Praça Pública do Teatro, pretende-se lancetá-lo de uma vez por todas, expurgar isso da prática diária da vida brasileira. Canudos não rendeu-se, e Euclides da Cunha encerra o seu livro lembrando-nos que não trata-se de defesa, mas de ataque.


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terça-feira, 13 julho 2010 14:32

Os Sertões: A luta 1 (2005)

De 2000 a 2007, o Teat(r)o Oficina Uzyna Uzona trabalhou na encenação de ‘Os Sertões’, o livro épico de Euclides da Cunha que descreve a Guerra de Canudos do século XIX no sertão brasileiro, liderado por Antônio Conselheiro. O resultado final foi uma pentalogia, formada pelas peças ‘A Terra’ (2002), ‘O Homem I’ (2003), ‘O Homem II’ (2003), ‘A Luta I’ (2005) e ‘A Luta II’ (2006), totalizando 27 horas de teatro. ‘Os Sertões’ relata os episódios da Guerra à luz da história passada e presente do Brasil e em relação à batalha do grupo contra o magnata da mídia Sílvio Santos, que queria derrubar o teatro histórico.

Dedicada "ao poeta Oswald de Andrade e ao empresário, animador e ator Sílvio Santos", a terceira parte do livro conta o incidente causador da guerra, quando um juíz de Juazeiro embarga uma remessa de madeira, que já tinha sido paga e que seria entregue para a construção da Igreja Nova de Canudos. Três expedições são enviadas pelo Exército Nacional e derrotadas, a última delas comandada pelo famoso Coronel Moreira César. O Exército foi submetido à humilhação de ter soldados desertando e fugindo e de ter o corpo do Coronel Tamarindo empalado. Ele acabou sendo o personagem principal de uma instalação macabra na estrada para Canudos, criada pelos Jagunços e pelas Mandrágoras para intimidar novas expedições. O primeiro movimento de A Luta é escrito em versos de cordel. A Luta I também amplia o espaço cênico, com casas trincheiras da invencível Canudos, que efetivamente formam uma coluna vertebral na pista, e os espaços aéreos dos mutãs, esconderijos usados pelos índios nos galhos superiores das árvores para a caça do jaguar, que os seguidores de Antônio Conselheiro reinventaram. Lirinha, um músico da banda pernambucana Cordel do Fogo Encantado, trouxe a sua paixão por sonoplastia, gravando sons do próprio teatro e transformando-os em tiros, artilharia, criando através da música a vanguarda da luta. O espaço físico da performance é estendida para o mundo, com imagens gravadas, sampleadas, bordadas nas ruas ao redor do teatro, nos camarins, nos locais escondidos da visão direta da audiência, fazendo cinema ao vivo.


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De 2000 a 2007, o Teat(r)o Oficina Uzyna Uzona trabalhou na encenação de ‘Os Sertões’, o livro épico de Euclides da Cunha que descreve a Guerra de Canudos do século XIX no sertão brasileiro, liderado por Antônio Conselheiro. O resultado final foi uma pentalogia, formada pelas peças ‘A Terra’ (2002), ‘O Homem I’ (2003), ‘O Homem II’ (2003), ‘A Luta I’ (2005) e ‘A Luta II’ (2006), totalizando 27 horas de teatro. ‘Os Sertões’ relata os episódios da Guerra à luz da história passada e presente do Brasil e em relação à batalha do grupo contra o magnata da mídia Sílvio Santos, que queria derrubar o teatro histórico.

Dedicado à "criação de uma atitude heróica e anti-heróica daqueles que vão à Guerra e dizem: Adeus, Homem!", a teatralização do segundo movimento da segunda parte de Os Sertões apresenta a passagem do homem re-voltado para o trans-homem, criador de uma possibilidade alternativa para a aventura humana na Terra. A partir da estória de Antônio Conselheiro, todo o teatro revive a sua morte seminal: um homem comum que, por amor, transforma-se em um líder anti-messiânico, arregimentando uma legião de sertanejos – como raízes de solidariedade no interior da Bahia – que, em mutirão, ergueu açudes, igrejas e cemitérios. A comunidade chegou a contar com 25 mil habitantes, sendo na época a segunda maior cidade da Bahia. Os Frades Capuchinhos tentaram dispersar o povo de Canudos "diplomaticamnte". A sua recusa em obedecer a ordem oficial religiosa leva o Frei Evangelista a amaldiçoar os seguidores de Antônio Conselheiro em nome de Jesus. A Cidade prepara-se para a guerra.


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De 2000 a 2007, o Teat(r)o Oficina Uzyna Uzona trabalhou na encenação de ‘Os Sertões’, o livro épico de Euclides da Cunha que descreve a Guerra de Canudos do século XIX no sertão brasileiro, liderado por Antônio Conselheiro. O resultado final foi uma pentalogia, formada pelas peças ‘A Terra’ (2002), ‘O Homem I’ (2003), ‘O Homem II’ (2003), ‘A Luta I’ (2005) e ‘A Luta II’ (2006), totalizando 27 horas de teatro. ‘Os Sertões’ relata os episódios da Guerra à luz da história passada e presente do Brasil e em relação à batalha do grupo contra o magnata da mídia Sílvio Santos, que queria derrubar o teatro histórico.

Para se entender a alma do sertanejo—o que levaria a natureza desse homem a resistir até o último dia em Canudos—Euclides da Cunha relembra em seu livro a formação da sociedade brasileira, a sua origem telúrica, animal e tupi. A segunda parte do livro (e a segunda peça, ‘O Homem I’), é sobre o vigoroso abraço do vencedor, o colonizador europeu céltico, copulando com o derrotado, com os escravos dos navios, formando o tipo "brasileiro-sem-tipo". Misturas de todas as espécies têm espaço no palco, na surpreendente miscigenação já presente no elenco e na equipe do próprio Teatro Oficina. É a estória do Homem Brasileiro, do Homem do País de fora cruzando com o País de dentro, até a Revolta contra a própria noção—imposta e importada—de homem, com o aparecimento de Zaratustra Antônio Conselheiro.


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terça-feira, 13 julho 2010 14:22

Os Sertões: A Terra (2002)

De 2000 a 2007, o Teat(r)o Oficina Uzyna Uzona trabalhou na encenação de ‘Os Sertões’, o livro épico de Euclides da Cunha que descreve a Guerra de Canudos do século XIX no sertão brasileiro, liderado por Antônio Conselheiro. O resultado final foi uma pentalogia, formada pelas peças ‘A Terra’ (2002), ‘O Homem I’ (2003), ‘O Homem II’ (2003), ‘A Luta I’ (2005) e ‘A Luta II’ (2006), totalizando 27 horas de teatro. ‘Os Sertões’ relata os episódios da Guerra à luz da história passada e presente do Brasil e em relação à batalha do grupo contra o magnata da mídia Sílvio Santos, que queria derrubar o teatro histórico.

Em ‘A Terra’, o primeiro impacto é a geografia do sertão. Euclides da Cunha descreve cada parte do sertão na primeira parte deste livro, revelando ao leitor uma radiografia da região. Na peça, uma ópera carnavalesca, um épico musical brasileiro, os atores são a terra, a vegetação, o vento, os animais, os rios, a seca. Isto revela os segredos mais íntimos da natureza, que também vibram nas artérias humanas e trans-humanas. Quando esta obra retorna como overture musical de toda a pentalogia, enriquecida pela experiência que as obras subsequentes trouxeram aos criadores e à audiência, ela ganha uma visão atualizada da interferência humana no seu meio ambiente. O poder destrutivo, proporcional ao poder financeiro, coloca em pauta a discussão acerca do modo pelo qual o espaço é ocupado, inclusive a especulação do setor imobiliário que hoje nos cerca, não somente o Teatro Oficina, mas todo o mundo, agora mais quente e mais árido.


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